Em Tel Aviv, Tinder é coisa séria (até quando não é)

Hannah Hebron
3 min readApr 17, 2018

Deu match? Mazal Tov!

Israel é um país bem pequeno, com uma história de menos de 100 anos de existência como Estado e muitos contrastes. Um caldeirão de tensões políticas, religiões, costumes e culturas ferve todos os dias, e borbulha de um jeito muito peculiar em Tel Aviv.

Como? Vamos lá, um pouco de contextualização:

- O serviço militar é obrigatório em Israel. Três anos para os homens e 2 para as mulheres;

- A maior parte da população de Tel Aviv é judia secular, ou seja, jovens que nasceram em famílias judias, mas não são religiosos (cerca de 43% dos judeus acima de 18 anos do país se consideram não religiosos);

- Os jovens israelenses costumam viajar por alguns meses depois que terminam o exército. América do Sul e Sudeste Asiático são dois dos destinos preferidos;

- A maioria se muda da casa dos pais entre o fim do exército e o início da faculdade (gap de cerca de 1/2 anos)

A verdade é que por mais “moderninhos” e não religiosos que os jovens de Tel Aviv sejam, estamos falando de um país com uma cultura fortemente delineada pela religião. Das diversas perseguições que o povo judeu sofreu, passando pelos terríveis acontecimentos da Segunda Guerra Mundial, e até os dias de hoje, o que se nota é que essa é uma nação com uma mentalidade voltada para a união e para a família (inclusive, não é difícil receber um convite inusitado para jantar na casa dos pais do seu “interesse romântico” em algum feriado, principalmente se você não tem família no país). Resumindo, como diria Tom Jobim “fundamental é mesmo o amor, é impossível ser feliz sozinho”.

Se em muitos países, apps de paquera estão ali para dar uma bombada na vida sexual, e com alguma sorte acabam em algo a mais, em Tel Aviv a brincadeira tem um código de conduta menos “soltinho” envolvendo date (nada de se encontrar em festa, e aqui não tem o famoso boteco pra deixar tudo mais leve) e nem sempre um “na minha casa ou na sua?” no fim da noite.

Conversando com 30 jovens adultos de 18 a 35 anos, participantes da comunidade online “Secret Tel Aviv” (um dos maiores sites de eventos/cultura/turismo do país, com um grupo de mais de 100 mil participantes no Facebook), me deparei com fatos curiosos:

1.Todos os 30 entrevistados tinham mais de 1 app de paquera

Apps são só mais uma forma de conhecer alguém. Nem mais nem menos sério do que outras formas. E contar que conheceu alguém em um aplicativo também não é tabu;

2. Todos falaram abertamente sobre sexualidade

Mesmo tendo a opção de se absterem, héteros, gays, bis e pan sexuais se reconheceram como preferiam sem nenhum pudor;

3. Ser solteiro é bom, mas…

A maioria expressiva dos entrevistados respondeu que prefere a vida a dois do que a vida de solteiro;

4. Espiritual, mas nem tanto

A maioria dos entrevistados vinham de um lar judaico, seguidos por alguns muçulmanos que também se consideravam “não muito religiosos”, budistas e ateus. O ponto em comum é que todos disseram que valorizavam mais suas liberdades individuais do que valores religiosos;

5. Somente o necessário

Ao escolher uma palavra para definir o uso dos aplicativos, a maioria descreveu como “necessário para encontrar alguém”, pois não se sentiam confortáveis em abordar pessoas em um bar ou boate.

E Israelense tem fama de ser direto: menos ghosting e mais verdades ditas na cara, pro bem ou pro mal. Também é normal falar sobre família, dinheiro e outros assuntos delicados logo no primeiro encontro — o que pode abrir espaço pra mais intimidade logo de cara. Sexo é consequência, nem sempre rola de primeira, mas quando rola, é bem improvável que alguém vá pegar um táxi de madrugada. Por isso, que ninguém se assuste com uma xícara de café pela manhã e uma ajuda pra achar o ônibus certo pra casa no maps.

A verdade é que pra quem estava acostumada com um “me encontra na São Salvador” ou “Vamo tomar uma cervejinha ali por Vila Madalena”, esse é um mundo completamente novo, onde intimidade não é bem um problema. Parece que em Tel Aviv a onda é parecer descolado, mas no fundo no fundo, viver em uma contagem regressiva para desinstalar o app.

--

--

Hannah Hebron

A Brazilian journalist living in Tel Aviv and writing in portuguese and english about fashion, feelings and work. Yeah, a lot… But you’ll get it eventually.